domingo, 25 de novembro de 2007

Cheiros da infância

Domingo.
Na infância, era dia de almoçar na casa de minha avó.
Cozinheira de mão cheia, ela fazia questão de agradar a gregos e troianos e preparava a comida que cada um de nós mais gostava. Resultado? A mesa era de uma fartura, de uma beleza e de um carinho estonteantes.
Ali estavam materializados os cuidados de D.Marina. Ela ia aos detalhes, caprichava mesmo.
Àquela altura eu era neta única. Os outros eram meninos.
E eu tinha meus privilégios... ah se tinha!
Como num ritual, logo após a nossa chegada ela pedia a meu avô que fosse buscar pão fresco. Enquanto isso picava cuidadosamente alguns dentes de alho em pedacinhos quase que invisíveis de tão pequenos. Depois fritava em azeite até que ficassem bem douradinhos. O cheiro se esparramava pela casa, aguçando apetites.
E lá vinha ela, com um pãozinho francês ainda quente, partido ao meio, regado de azeite e com aquele alho fritinho espalhado com arte.
Os primos queriam. Mas ela parecia fazer questão de dizer: “Não! Esse é dela! Fiz pra ela! Faço outros pra vocês.”
E eu, encantanda com o paparico, abria um sorriso rasgado de quem se sente primeira e única.
Ficávamos por ali, adultos conversando e crianças pintando o sete. Ao piano, meu avô.
Como eu era a única menina, na maioria das vezes não participava das brincadeiras dos primos.
Mas Seu Antonio me colocava sentada sobre a tampa do piano. Ali ouvi, decorei, cantei, e aprendi a gostar do que há de melhor na MPB. Ali aprendi limites, valores.
Ali aprendi que minha vida era mesmo um palco iluminado.
Saudades de vocês, meus avós, onde quer que vocês estejam.